domingo, setembro 5

Augusto dos Anjos em poemas e película

O poeta paraibano Augusto dos Anjos, que era mestre em retratar a condição efêmera da vida, deixou como herança para a humanidade poemas belíssimos que fazem qualquer otimista cair no mais cru realismo. Por conhecer profundamente a anatomia humana e usar nos seus textos termos da medicina, ele tornava o que escrevia mais real, da centelha que clareia a existência ao triz que a separa da morte. A sua visão sombria não vem apenas com o motivo de chocar, mas com a intenção de convencer quem o ler, por meio de palavras "sujas", da ínfima e transitória condição de existir.

Eu, filho do carbono e do amoníaco,
Monstro de escuridão e rutilância,
Sofro, desde a epigênesis da infância,
A influência má dos signos do zodíaco.


Profundíssimamente hipocondríaco,
Este ambiente me causa repugnância...
Sobe-me à boca uma ânsia análoga à ânsia
Que se escapa da boca de um cardíaco.


Já o verme — este operário das ruínas —
Que o sangue podre das carnificinas
Come, e à vida em geral declara guerra,


Anda a espreitar meus olhos para roê-los,
E há-de deixar-me apenas os cabelos,
Na frialdade inorgânica da terra!


Em “Psicologia de um vencido” o uso de antagonismos reforça a ideia de que escuridão e claridade se completam e onde há vida há morte.

Transubstancial, curta metragem dirigido pelo cineasta paraibano Torquato Joel em 2003, mostra da forma mais fiel o mundo imagético do poeta conterrâneo. Efeitos de sobreposição de cenas, faíscas de luz, uso de silhuetas fazem parte da composição do filme. A fidelidade da película aos textos do poeta está até mesmo na inquietação causada pelo impacto da sua temática.



A reconstituição cinematográfica do universo idealizado nos poemas dá a impressão de que as obras trabalham em conjunto, uma como a perfeita ilustação da outra.

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